Bayan treinando no La Bombonera, estádio do Clube Atlético Boca Juniors

Virginia Pico em Buenos Aires, por ACNUR

 

BRASÍLIA [ ABN NEWS ] — Há três anos, quando Bayan Mahmud subiu sem ser notado no barco que partia de Cape Coast, no sul de Gana, não tinha a menor ideia de qual para onde ia. Sentia medo, e a única coisa que desejava era ir para o mais longe possível.

E assim foi. Três semanas depois, ainda escondido no navio, o jovem de 16 anos desembarcou do outro lado do Oceano Atlântico, na Argentina. Nunca imaginou que a sorte estaria ao seu lado e suas habilidades futebolísticas mudariam sua vida para sempre, em um país onde o futebol é quase uma religião.

Bayan havia chegado a Cape Coast depois de fugir de um conflito ressurgido entre as tribos Mamprusi e Ksusasi, no norte de Gana. Quando os confrontos começaram, em 2010, ele e seu irmão Muntala viviam em um orfanato, uma vez que seus pais haviam sido assassinados em uma onda de violência em 2005.

Os dois irmãos fugiram juntos, mas se separaram durante a jornada. Sozinho, Bayan chegou até o porto com muitas incertezas. Sobreviveu à viagem transatlântica graças a bondade de alguns tripulantes, que lhe deram água e comida sem despertar suspeitas a bordo.

Quando o barco finalmente chegou a um porto na costa argentina, o jovem teve de enfrentar novos desafios. Dormiu na rua por duas noites até que uma pessoa o ajudou a tomar um ônibus para a capital do país, Buenos Aires.

Já na cidade grande, Bayan encontrou alguns jovens senegaleses que indicaram o caminho da Comissão Nacional para os Refugiados (CONARE). Bayan foi reconhecido como refugiado pelas autoridades argentinas e, por ser um menor desacompanhado, teve o acompanhamento de um tutor da Defensoria do Povo da Nação.

Mas seu destino deu uma guinada inesperada quando foi descoberto por um observador do Boca Juniors – um dos clubes mais populares da Argentina – enquanto jogava uma pelada com amigos em uma praça de Buenos Aires. Ele foi convidado a ir ao clube, onde se cadastrou e fez uma prova. Hoje, Bayan joga nas divisões juvenis do clube, onde continua aperfeiçoando sua destreza. Ele tem talento, e o Boca acredita em um futuro futebolístico promissor para esse jovem ganês.

O Boca o hospedou na sua tradicional Casa Amarela, onde o clube recebe jovens jogadores do interior do país, e também o apoiou para que concluísse sua educação secundária. Além disso, o Boca o ajudou a encontrar seu irmão Muntala por meio das redes sociais. Por sua vez, o ACNUR está ajudando com os trâmites da reunião familiar. “É a única família que tenho, eu seria muito feliz se ele estivesse aqui comigo”, comenta Bayan.

Enquanto isso, Bayan treina todos os dias e sonha em jogar na primeira divisão, vestindo a emblemática camiseta “azul e dourada” e encantando como meio campista no estádio do Boca, popularmente conhecido como La Bombonera. “Quero ser o primeiro jogador negro na seleção argentina”, diz.

A história inspiradora, o sorriso largo e o carisma fizeram de Bayan um personagem querido e respeitado por seus companheiros, e despertaram o interesse de diversos meios de comunicação. Para o presidente do Boca, Daniel Angelici: “Bayan é um rapaz forte, alegre, querido e cheio de esperança. Para um clube como o Boca, um clube de imigrantes, é uma enorme satisfação tê-lo conosco”.

Bayan, que é um dos quase 5 mil refugiados e solicitantes de refúgio na Argentina, não só soube superar as adversidades, mas também demonstrou a importância da integração. Sua história, aliás, destaca o valor do esporte para meninos e meninas. Para os jovens refugiados, o esporte pode driblar a solidão, os problemas psicossociais e o estresse causados pelo desenraizamento. Também contribui para a saúde, o bem estar e integração social.

Enquanto sonha com um futuro brilhante como jogador de futebol, Bayan lembra de seus pais. “Sempre rezo por eles, sei que estariam orgulhosos de mim”, diz.

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